A diferença entre desvio e acúmulo de função

Publicado por nicolauwarisadv em quinta-feira, julho 17, 2014 com Nenhum comentário
Um tema que costuma gerar certa confusão é o da diferença entre desvio de função e o acúmulo de função.

DESVIO DE FUNÇÃO

Primeiramente, qualquer problema jurídico, deve ser analisado caso a caso, adiante teremos regras gerais estipuladas na lei, doutrina e jurisprudência acerca desta temática. Portanto, quanto ao desvio de função teremos quando o trabalhador é contratado para exercer determinada função (a qual possui suas atribuições específicas), mas por imposição do empregador exerce - de maneira não excepcional ou não eventual - uma função distinta daquela.

Não existe na lei escrita uma normatização estrita ao desvio de função, porém, de uma sistemática legal, bem como da jurisprudência e lecionamento doutrinário é possível se construir uma base para dirimir a problemática.

O art. 884 do Código Civil (aplicado subsidiariamente às relações de emprego por força do art. 8º, parágrafo único, da CLT) veda o enriquecimento sem causa, impelindo que o aproveitador restitua ao lesionado o quantum indevidamente auferido.

De igual teor o art. 927 do Código Civil aduz que aquele que causar dano a outrem, por ato ilícito, fica obrigado a repará-lo. Tanto que bem está disposto no art. 483, "a" da CLT que a exigência de serviços alheios ao contrato de trabalho pode gerar a rescisão do mesmo, com a consequente indenização.

Já no campo jurisprudencial existe a OJ-SDI nº125 com o seguinte teor:
DESVIO DE FUNÇÃO. QUADRO DE CARREIRA.
O simples desvio funcional do empregado não gera direito a novo enquadramento, mas apenas às diferenças salariais respectivas, mesmo que o desvio de função haja iniciado antes da vigência da CF/1988.
Assim, provado o desvio de função, terá o empregado o direito ao recebimento das diferenças salariais entre seu cargo e o exercido desvirtuosamente, respeitada a prescrição de 05 (cinco) anos de acordo com a súmula 275 do TST.

Ainda, quando há pedido de reconhecimento do desvio de função postulado pelo trabalhador em processo trabalhista, a partir do sistema de presunções favoráveis ao trabalhador, deve ocorrer a inversão do ônus da prova, seja quando da interpretação da norma, tanto a material como a processual, mas sempre com lentes em favor do trabalhador.

Nunca é demais lembra, que o Direito do Trabalho é inspirado pelo princípio da realidade, desconsiderando registros formais, para valorizar a efetividade dos fatos. Por outro lado, o art. 460 da CLT é definitivo, quando dispõe que na falta de estipulação do salário, ou não havendo prova sobre a importância ajustada, o empregado terá direito a perceber salário igual ao daquele que, na mesma empresa, fizer serviço equivalente, ou do que for habitualmente pago para serviço semelhante.

Portanto, se o trabalhador teve o seu contrato modificado apenas por vontade do Empregador, que lhe atribuiu uma carga maior de trabalho sem a devida contraprestação salarial, ou seja, sem ter salário e cargo compatíveis com as suas novas atribuições e responsabilidades, configurando alteração em desequilíbrio à natureza comutativa e onerosa decorrente da relação de emprego.


ACÚMULO DE FUNÇÃO

Já o acúmulo de função, diferentemente do puro desvio, ocorre quando o trabalhador, além de exercer sua própria função, também exerce de forma, não excepcional e não eventual, funções de outro cargo.

Existe uma corrente doutrinária e jurisprudencial que entende que, pela ausência de dispositivos legais adstritos ao acúmulo funcional, o Estado-juiz está impedido de conceder a prestação jurisdicional para condenar o empregador ao pagamento de qualquer indenização.

Para estes, o pagamento em decorrência do excesso só seria possível se estipulado em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

O art. 456, parágrafo único, da CLT, regra que na falta de cláusula expressa, o empregado considera-se obrigado a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal. Esta disposição tem sido usada como fundamento para não reconhecer o direito de indenização pelo acúmulo funcional.

Contudo, também é do entendimento de outros juízes e doutrinadores, que os dispositivos do Código Civil que vedam o enriquecimento sem causa e preditam a indenização pelo ato ilícito (conforme já apresentado no tópico do desvio de função) são suficientes para condenar ilegal o acúmulo.

Neste sentido, parte da jurisprudência tem fixado que o trabalhador que exerceu funções excedentes ao seu cargo (e principalmente quando estas são incompatíveis com sua condição pessoal) tem direito a receber um plus (acréscimo salarial), que geralmente é fixado em um percentual de sua remuneração.

Logo, o que se pode dizer é que o acúmulo funcional ainda guarda certa divergência nos julgados, sendo mais difícil tê-la reconhecida como ilegal na mesma proporção do desvio funcional.

Por fim, como já ressalvado no início deste texto, deve ser analisado caso a caso para que se verifique a possibilidade ou não do pleito de reclamação trabalhista por desvio ou acúmulo de função.

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TONHOLI, Rafael. A diferença entre desvio e acúmulo de função.[online] Disponível na Internet via WWW. URL: goo.gl/I6mswb. Arquivo capturado em 17 de junho de 2014.